Pedro Daltro – Medo e Delírio em Brasília – 27/08/22
“Se tem alguém que não pode errar, nesta quadra da História, é ele [Alexandre de Moraes]. Ele não pode queimar cartucho. Muita gente diz que essa operação pra cima dos empresários foi um excesso. E, sim, aparentemente foi: numa quadra normal da História aquelas mensagens jamais seriam suficientes para abrir um inquérito. (…) Os inquéritos de ofício também eram excessos, mas olhe pra trás e ‘reflita um segundo’: foram esses inquéritos que fizeram o STF despertar de seu sono furioso. Foi uma das poucas vezes em que alguma instituição de fato peitou Bolsonaro e tentou diminuir o estrago. O país está há mais de ano falando em golpe, ouvindo uma retórica perigosíssima, vendo o Brasil fazendo de tudo para virar uma teocracia, então tenhamos alguma perspectiva da desgraça em que a gente está, e vejamos se o ‘Xandão’ tem carta na manga ou não.
E, convenhamos: o desespero do [Augusto] Aras fez parecer que o ‘Xandão’ tinha dado tiro no lugar certo. Olha a influência que o amigão do Aras, Meyer Nigri, tem no governo Bolsonaro:
‘O empresário Meyer Nigri, um dos oito alvos da operação policial desta terça-feira, influenciou diretamente em ao menos três indicações do alto escalão do governo Bolsonaro’ (Bela Megale, O Globo, 24/08/22). São eles: Ricardo Salles, do Meio Ambiente, Nelson Teich, da Saúde, e Fábio Wajngarten, que saiu da Secom mas hoje está na campanha do Bolsonaro. ‘O executivo também foi decisivo na escolha de Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República. Quando o nome do procurador subiu no telhado por suas relações com o PT, Nigri entrou em campo e ajudou a reverter a situação’. Com esse nível de contato, imagine o que vão achar no telefone desse sujeito.
O Moraes tá pescando, mas a gente já abraçou o caos, e pelo menos alguém que de fato pode peitar Bolsonaro, o mais criminoso e golpista dos presidentes, despertou do sono. ‘Nos bastidores, emissários do ministro têm garantido que ele não daria sinal verde às buscas se não houvesse evidências de uma ação concreta para organizar atos golpistas. O que está sendo feito agora, segundo esses interlocutores, é o cruzamento de dados coletados com o material apreendido para seguir o caminho do dinheiro já que alguns empresários também eram investigados no inquérito das milícias digitais’ (Malu Gaspar, O Globo, 25/08/22).
E eis por que o ‘Xandão’ não pode errar:
‘Auxiliares do presidente passaram a descrever a ação deflagrada na terça-feira, por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), também como a ‘nova facada’. Trata-se de uma referência ao atentado realizado contra Bolsonaro na campanha de 2018, fato que teve peso decisivo para sua eleição. Para esse grupo, que inclui ministros do governo e filhos do presidente, a controversa ação de Moraes pode ser usada para justificar, perante a opinião pública, ataques de Bolsonaro ao magistrado. Além disso, reforça seu discurso de ‘vítima’. Esses auxiliares apontam que o chefe do Executivo planeja ‘surfar’ nessa onda, já que viu que boa parte dos empresários, políticos e até integrantes do Judiciário considerara ‘desproporcional’ a decisão de Moraes. Dados internos colhidos pelo marketing da campanha apontam que Bolsonaro perde eleitores com críticas às urnas, mas ganha quando adota a tônica da liberdade de expressão e excessos do Judiciário’. (Bela Megale, O Globo, 26/08/22)
E olha o papo do Bolsonaro na live dele: ‘A escalada contra a liberdade tem se avolumado em cima desses empresários. Desses oito, dois eu conheço muito bem, trocam informações no zap comigo’ (imagina o que Bolsonaro não conversa com esses dois, provavelmente o Hang e o Nigri, dada a influência que eles têm no governo). No meu entender não falta mais nada para que, realmente, possamos ter um problema grave no Brasil, provocado por uma pessoa’.
Voltamos a dizer: se tem alguém que não pode errar é o ‘Xandão’. E ao que parece a última jogada dele foi arriscada e bem recebida pela campanha do Bolsonaro, o que é preocupante.”
Fonte: Medo e Delírio em Brasília (acesse aqui)
Autor: Pedro Daltro e Cristiano Botafogo
Publicado em: 27/08/2022