Miriam Leitão – O Globo – 15/09/22
A violência política é crescente e isso não é por acaso. Miriam Leitão alerta: é um erro tratar como eventos isolados o que é projeto sistêmico. Bolsonaro quer uma guerra civil para impor uma ditadura. Anuncia este desejo há décadas, e seus quatro anos de governo foram dedicados a avançar no plano. A coluna da jornalista em O Globo elenca essas características de forma didática e precisa.
“O presidente da República tem a violência como projeto. Por isso fez o incessante trabalho de ampliar o acesso às armas, vociferar contra pessoas que ele escolhe como alvo e jamais desautorizar ato truculento de seus seguidores”.
Cerco ao jornalismo
“Bolsonaro escolheu a imprensa como um dos alvos, e dentro dela mira pessoas, porque assim é o método. Ao individualizar, ele autoriza o ataque e canaliza a raiva que alimenta com fins políticos”.
A colunista compara a tática com o que fez Hugo Chávez na Venezuela: “apontava os jornalistas que ele definia como inimigos. No fim, foram fechados vários jornais e emissoras. O governante autoritário quer eliminar a imprensa e para isso começa intimidando alguns jornalistas”.
Violência contra a mulher
Das 2,8 milhões de postagens com ofensas ou agressões a jornalistas no primeiro mês de campanha, segundo relatório dos Repórteres sem Fronteira, 88% foram contra mulheres.
Miiriam aponta um ato falho de Bolsonaro em entrevista ao SBT: “O número de violência contra a mulher caiu assustadoramente”. Além de ser mentira, pois a maioria dos indicadores é de alta, é revelador que tenha usado a palavra “assustadoramente”. Bolsonaro é transparente. “O presidente da República gosta da violência, ele sente prazer nela. Ele se regozija em saber, ver ou provocar o sofrimento alheio. É isso que explica sua louvação da tortura”.
CACs são milícia
“Mas preciso ver além da perversão. O trabalho de Bolsonaro tem tido um objetivo, uma direção, é parte do projeto maior de elevar o conflito dentro da sociedade brasileira e realizar seu sonho autoritário para o Brasil”.
“Os CACs são a semente de uma milícia armada de Bolsonaro. Nós sabemos disso. E o país finge que ali estão esportistas ou inofensivos colecionadores”.
(Neste item vale chamar a atenção para a pouco comentada transformação da Polícia Rodoviária Federal em uma espécie de PM nacional, subordinada e fiel ao presidente, como revelou reportagem da Piauí).
Terrorismo eleitoral
“É um erro tratar como eventos isolados o que é sistêmico. Com o culto às armas e os ataques a pessoas ou instituições, Bolsonaro quer atingir a democracia. A começar do direito de voto. Intimidar eleitores de outros candidatos, especialmente lulistas, a não irem votar. Cria-se um ambiente de temor para acuar o cidadão”. Isso inclui a sistemática estratégia de desacreditar os institutos de pesquisa e, claro, as urnas eletrônicas.
O golpe é um processo
“O mais eficiente para se proteger é o país ter a visão de conjunto. Foram quase quatro anos de execução do plano de impor a truculência como a arma política na busca do projeto autoritário. Não pergunte se haverá um golpe. Entenda que há um processo para o qual o país está sendo arrastado, com a conivência das Forças Armadas, a displicência de algumas instituições e autoridades, a bênção de algumas igrejas. Esse é o golpe. O Brasil está vivendo neste momento o maior risco desde a sua constituição como Estado independente. O que quer Bolsonaro? Ele mesmo disse há 25 anos. Uma guerra civil“.
Fonte: O Globo (acesse aqui)
Autor: Miriam Leitão
Publicado em: 15/09/2022