“Está por um fio”, ameaça presidente. Às vésperas das urnas, reportagens descartam apoio militar, mas Exército lança nota desmentindo.
“Isto está por um fio. Não importando a causa, quando o presidente não cumprir uma das ordens ilegais, aí as Forças Armadas terão que agir. E isso, ao que parece, não vai demorar”. Em 29 de setembro, a três dias das eleições, o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro compartilhou em uma lista de transmissão no Whatsapp texto que cita possível ruptura institucional em resposta a “ilegalidades” do STF contra o Poder Executivo.
Na véspera, em transmissão pelo Youtube, Bolsonaro havia espalhado uma fake news para atacar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e seu presidente, Alexandre de Moraes. Segundo o boato mentiroso, pessoas vestidas de verde e amarelo seriam proibidas de votar. “Como é que é, Alexandre de Moraes? Proibir usar camisa da seleção? É interferência demais. Tá com medo do quê? Do mar de verde e amarelo? Preocupado com o mar de verde amarelo votar e aparecer nome do Lula ganhando? É isso, TSE? É isso?”, vociferou. E voltou a lançar desconfiança sobre as urnas, como vem fazendo crescentemente: “Um caso hipotético: alguém fala que houve fraude. O que vocês vão fazer para dizer que não houve fraude ou que houve fraude?”.
Militares apoiariam golpe?
A pergunta embutida nas ameaças de Bolsonaro desde que chegou ao poder não tem resposta, a dois dias das eleições. Duas reportagens na reta final afirmam ter ouvido de membros do Alto Comando das Forças Armadas que não há qualquer possibilidade de apoiarem uma ruptura institucional. O Exército, porém, lançou nota desmentindo o conteúdo de uma delas, de O Estado de São Paulo, com direito a um agressivo carimbo vermelho “fake news“.
A reportagem é assinada por Felipe Frazão e foi publicada no dia 30 de setembro. O título é “Comando do Exército indica à tropa que não contestará apuração eleitoral“. Afirma que, em reunião no início de agosto, os generais do Alto Comando do Exército teriam entrado em acordo sobre respeitar o resultado das urnas e depois divulgado essa mensagem para a tropa. A resposta veio no mesmo dia: em nota, o Alto Comando manifesta “total repúdio ao conteúdo” da reportagem. “Na reunião do Alto-Comando do Exército não foram tratados assuntos de natureza político-partidária. Os dados são inverídicos e tendenciosos”, diz o comunicado.
Outra reportagem sobre o tema publicada na semana saiu na Agência Pública, em 28 de setembro. Monica Gugliano esmiúça todo o histórico de politização das Formas Armadas e a relação dos militares com Bolsonaro. “Nem um tanque nas ruas“, diz o título. O texto afirma: “os 16 generais de quatro estrelas têm recorrido ao silêncio como resposta e, à boca pequena, afirmam que nunca sequer foi cogitada alguma medida de força contra as instituições democráticas”. “Não estão entendendo que o presidente é um lapso na história do país, qualquer presidente é um lapso na história. O Exército está aí e continuará”, afirmou um oficial general da reserva “com grande influência na Força”. Ao contrário da primeira, esta reportagem não despertou reação da instituição.
Talvez o texto do Estadão tenha ultrapassado o oficialmente aceitável ao afirmar que o Alto Comando discutiu política em sua reunião, coisa que a reportagem da Agência Pública não fez. Ainda assim, a negativa contundente diante de um texto que descarta risco de golpe revela, no mínimo, que o Alto Comando se submete a ordens de um Palácio recheado de golpistas.
Se as ordens continuarão a ser cumpridas quando o presidente se recusar em aceitar o resultado eleitoral, é dúvida que o país não verá esclarecida até que as “bocas pequenas” sejam chamadas ao vamos-ver.
Fonte: Estadão (acesse aqui)
Autor: Felipe Frazão
Publicado em: 30/09/2022