Violência escala e polícia admite terrorismo

Atentados violentos podem levar golpismo à derradeira etapa, servindo de pretexto para intervenção militar bolsonarista.

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Depois de 20 dias de rodovias fechadas e acampamentos em frente a quartéis, sem aparente perspectiva de que seja atendido o apelo por uma intervenção militar, o golpismo bolsonarista pode estar entrando em sua última e mais arriscada fase: a realização de atentados terroristas que levem à decretação de estado de sítio ou semelhante medida excepcional, com as Forças Armadas autorizadas a “restabelecer a lei e a ordem” antes da posse de Lula.

Em Sinop, norte do Mato Grosso, dois homens atearam fogo em pelo menos três carretas que tentaram furar os bloqueios golpistas, além de renderem e sequestrarem um funcionário da concessionária da BR-163. Foram presos no dia 21, e em sua posse a polícia encontrou uma arma de fogo, quase R$ 10 mil em dinheiro, nove galões de gasolina, isqueiros, duas sacolas com tecido usado para fazer as chamas se alastrarem, facas e facões. Na mesma região, homens tentaram explodir uma ponte e atiraram contra agentes públicos federais.

Na noite de 19 de novembro, cerca de dez homens encapuzados atacaram a base da concessionária da rodovia BR-163 entre Nova Mutum e Lucas do Rio Verde, atirando contra o prédio e uma viatura e ateando fogo a uma ambulância e um caminhão guincho. Ninguém ficou ferido.

“O atentado ocorreu na região de Sorriso (MT), onde vivem 24 dos 43 empresários do agronegócio suspeitos de financiar os atos golpistas que tiveram suas contas bloqueadas por ordem do STF, e que também doaram R$ 1,3 milhão para a campanha de Bolsonaro à reeleição”, informa Ricardo Kotscho, no UOL.

Em Santa Catarina a PRF desmontou cerca de 30 tentativas de bloqueio em rodovias federais entre os dias 18 e 21. A polícia divulgou imagens e uma nota destacando o caráter violento das últimas ocorrências. Afirma que “a maioria das paralisações do final de semana tiveram caráter diferente das realizadas logo após as eleições” e que os métodos e materiais empregados são os de “grupos terroristas e black blocs”. Foram registradas “ocorrências criminosas e violentas, promovidas no período noturno por baderneiros, homens encapuzados extremamente violentos e coordenados”.

São usados bombas caseiras feitas de garrafas com material combustível, rojões, óleo derramado na pista, miguelitos (pregos para furar pneus), pedras, barricadas com pneus queimados, latões de lixo e troncos de árvores cortados e jogados deliberadamente na pista. Houve ainda depredação do patrimônio das grades de proteção das rodovias.

No Mato Grosso foram onze trechos bloqueados. Circulam nas redes vários vídeos e relatos de intimidação armada a caminhoneiros. Estradas bloqueadas com terra e árvores derrubadas causaram acidentes no Paraná e no Tocantins, deixando 13 feridos. Em Ariquemes (RO), uma carreta foi incendiada e veículos foram saqueados em rodovia interditada. Além disso, terroristas usaram uma escavadeira para romper uma tubulação de água deixando vários bairros sem abastecimento.

Autoridades: férias, “gabinete de crise”, silêncio

O diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques, entrou de férias no dia 16 de novembro, um dia depois que o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MP-RJ) pediu seu afastamento para investigação. Ele é suspeito de usar a instituição para interferir nas eleições – ao realizar centenas de bloqueios em estradas do Nordeste no dia do segundo turno e ser conivente com as manifestações bolsonaristas iniciadas no dia seguinte. Vasques foi indicado ao cargo por Flávio Bolsonaro.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, marcou para a manhã de 21 de novembro uma reunião de emergência no gabinete de crise do Ministério Público Federal. O objetivo é “tratar do avanço dos movimentos golpistas pelo Brasil”. Não se sabe que papel terá Aras – cuja atuação frente à PGR sempre se pautou pelos interesses de Bolsonaro – diante dessa escalada de violência. Reconhecer a gravidade da crise beneficia quais intenções?

O presidente da República segue em silêncio. “Desconfio que o capitão deve até estar achando bom. Não é o caos social que ele previa, mas pelo menos serve para manter mobilizada sua base de fanáticos fundamentalistas”, escreve Ricardo Kotscho. “De terrorismo, o chefe de todos eles entende muito bem, pois foi preso, processado e ejetado do Exército por planejar jogar bombas nos quartéis e no sistema de abastecimento de água do Rio de Janeiro quando ainda era tenente”.

Segundo Fabio Zanini, na Folha de S. Paulo, Bolsonaro gostaria de declarar apoio aos manifestantes, mas teme ser responsabilizado criminalmente. O general Braga Netto, candidato a vice-presidente derrotado na chapa de Bolsonaro, não parece ter o mesmo temor, pois segue se reunindo diariamente com manifestantes antidemocráticos e articulando as ações golpistas.

Fonte: Folha de SP (acesse aqui)

Autor: Caue Fonseca e João Pedro Pitombo

Publicado em: 23/11/2022