“A DEMONIZAÇÃO DAS PESQUISAS É UMA FORMA DE MANTER A MILITÂNCIA MOBILIZADA PARA, EM CASO DE DERROTA, APONTAR UM COMPLÔ COM IMPRENSA, JUDICIÁRIO E URNAS.”

Vera Magalhães – O Globo – 12/10/22

A proposta de punir os institutos de pesquisa e prender seus responsáveis substitui o ataque às urnas eletrônicas (visto que os militares não encontraram indício de fraude) e agora rivaliza com a intervenção no Supremo Tribunal Federal (STF) como o golpismo da vez entre os bolsonaristas.

Esse revezamento de ataques à democracia não é obra do acaso, mas estratégia permanente: o objetivo é conseguir implantar em boa parcela da sociedade a desconfiança em relação aos agentes, instituições e setores responsáveis por uma mínima estabilidade no país. Universidades, instituições científicas e a imprensa também são alvos da tática de demolição levada a cabo pela extrema-direita brasileira.

Os ataques “são coordenados, encadeados e premeditados. Atendem a uma estratégia clara — e eficiente — de minar a confiança da população em instituições e em instrumentos de informação imprescindíveis na democracia”, escreve a jornalista Vera Magalhães.

A intenção de mexer na composição do STF é explicitada por Bolsonaro e pelo vice (agora eleito senador) general Hamilton Mourão desde 2018. Mourão também já aventou um “autogolpe” e defendeu uma nova Constituinte feita por “notáveis”. Nas redes, a construção do descrédito do STF passa por “vilanizar a cada vez um ministro, atribuindo a eles características de personagens, como forma de gerar engajamento”.

Confrontado com mais uma forte reação negativa à nova ameaça, o presidente recua, nega, ataca a imprensa (“Vocês que inventaram isso“) mas deixa no ar a chantagem: pode adiar o plano desde que a Corte “baixe um pouco a temperatura”. E assim corrói mais um pouco a necessária solidez das instituições perante a sociedade.

Contra os institutos de pesquisas, o ministro da Justiça, Anderson Torres, determinou um inquérito da Polícia Federal, em pleno processo eleitoral. “Pretende-se que os institutos se recolham, coloquem freios e filtros na própria atividade. É evidente a tentativa de estrangular também financeiramente as empresas, uma vez que, envolvidas por um manto de falta de credibilidade criado por forças políticas, elas poderão ter dificuldade de encontrar contratantes no futuro”.

Em caso de derrota nas urnas, a demonização das pesquisas acrescenta mais um ingrediente para a revolta dos seguidores de Bolsonaro contra o “complô com institutos, imprensa, Judiciário e urnas, o rol completo de vilões” construído ao longo de todo o mandato.

Quanto à apuração paralela dos militares, cujos resultados são cobrados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), Bolsonaro não apenas mandou segurar a informação (“algo que de novo coloca os militares na condição de ser usados por ele como peças no jogo eleitoral”), “como inventou uma nova forma de caos: quer que seus apoiadores façam vigília nas seções eleitorais até a divulgação do resultado”.

A quem interessa o caos?“, já perguntou o presidente, em uma de suas lives. Também já conhecida na cartilha extremista adaptada da dupla Bannon-Trump, dos Estados Unidos, é a tática “acuse-os do que faz”. Bolsonaro sabe bem a quem interessa o caos.

Fonte: O Globo (acesse aqui)

Autor: Vera Magalhães

Publicado em: 12/10/2022