Livro de Samuel Huntington mostra como a degradação das Forças Armadas ameaça a segurança do Estado.
“A menos que seja criado um novo equilíbrio, a contínua ruptura das relações entre civis e militares não pode ajudar, mas prejudicar a dimensão do profissionalismo militar no futuro. Um corpo de oficiais políticos, dividido em facções, subordinado a fins ocultos, ressentindo-se de prestígio, mas sensível aos apelos da popularidade, colocaria em perigo a segurança do Estado”.
O repórter Marcelo Godoy, do Estado de S. Paulo, aponta preocupantes conexões entre a aventura bolsonarista das Forças Armadas brasileiras e as lições do livro O Soldado e o Estado. No momento em que o presidente coloca milhares de militares em cargos civis e altera a legislação para que oficiais da reserva possam receber salários milionários acumulando funções no governo, perdem-se de vista os valores que deveriam nortear as Forças Armadas.
Segundo Godoy, “o que define as ações civis e as do Estado é a legalidade. Entre os militares, o que os inspira é a honra. Se é imoral, nada feito“.
Ele lembra que os militares não são um corpo único. “Certamente nos quartéis existem os que silenciosamente cuidam dos afazeres diários sem esquecer que o fim último de quem veste a farda é a defesa nacional. Esta não se submete a interesses mesquinhos, à vaidade dos crachás e ao conforto dos cargos no Planalto ou no litoral”.
Mas algo mudou com o governo Bolsonaro. “Uma parte dos militares que o segue esqueceu tudo isso. E trocou o pensamento militar pelos hábitos civis”.
O livro de Huntington deveria constar na formação de futuros oficiais, para não termos novos generais como Paulo Sérgio de Oliveira, um ministro da Defesa que compra briga aberta com o sistema eleitoral civil. “Um corpo de oficiais forte e altamente integrado, imune à política e altamente respeitado por seu caráter militar, seria um imperturbável fator de equilíbrio na conduta da política”.
O comportamento dos generais do governo Bolsonaro “parece demonstrar que o controle civil objetivo do poder militar nunca foi uma realidade em nossa República”. É “consequência do poder que se deu a pessoas movidas por convicções radicais: elas se revelam amantes de ditaduras”.
“O maior serviço que os militares podem prestar ao País é permanecer fiéis a si mesmos, em silêncio e com coragem, à maneira militar, escreveu Huntington”.
Godoy adverte que, em breve, o país pode ser ver diante de uma encruzilhada histórica, e se pergunta: como reagirão os militares da ativa? Ele responde com a conclusão de O Soldado e o Estado: “Sobre os soldados, defensores da ordem, recai uma pesada responsabilidade. Se abjurarem o espírito militar, destroem primeiro a si mesmo e, depois, a Nação”.
Fonte: Estadão (acesse aqui)
Autor: Marcelo Godoy
Publicado em: 15/08/2022