Maria Cristina Fernandes – Valor – 18/08/22
O comportamento de Jair Bolsonaro na posse de Alexandre de Moraes como presidente do TSE não sugere que a cerimônia o tenha domesticado. A tese é de Maria Cristina Fernandes, no Valor.
Se a grandeza do evento e o discurso do empossado consagraram o consenso nacional e internacional em torno da confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro, a reação atônita do presidente indica muito mais fúria contida do que rendição às regras do jogo. Uma vez imerso no universo paralelo das paranoias e conspirações, é difícil encontrar um caminho de saída, ainda que se queira (e sua trajetória nos farta de demonstrar que ele não quer conciliação).
Assim como a leitura da carta-manifesto em defesa da democracia no dia 11 de agosto, a posse de Moraes no dia 16 também vem sendo retratada pelo bolsonarismo como evento de cunho “político-partidário”. “Dessa forma, ao presidente, escanteado, não restará alternativa senão buscar respaldo popular – e das Forças Armadas – contra o ‘golpe da urna eletrônica’”.
O apoio militar, ao que tudo indica, continua firme. “Na manhã seguinte à cerimônia, os grupos de WhatsApp da ‘comunidade militar’ amanheceram apinhados de mensagens sobre a necessidade de adiamento das eleições em função das dúvidas surgidas no código-fonte das urnas eletrônicas”. Circulam também mensagens preocupadas com o que acontece na Colômbia, onde o recém-eleito Gustavo Petro decidiu passar para a reserva a cúpula das Forças Armadas e da Polícia Nacional. Segundo os militares brasileiros, Lula poderia fazer o mesmo por aqui.
Enquanto isso, o comandante do Exército, Marco Antonio Freire Gomes, afunda ainda mais a instituição nas tramas anti-eleitorais, pois “achou por bem soltar uma nota sobre o afastamento do coronel Ricardo Sant’Anna da comissão que acompanha a fiscalização das urnas eletrônicas. O coronel infringiu três portarias do Exército, além do regulamento disciplinar da corporação e o estatuto dos militares. Ainda assim, não recebeu nenhuma punição. Contrariando todas as normas do Exército, o comandante, por meio da nota, limitou-se a respaldar o coronel ao dizer que as posições pessoais dos oficiais não interferem no desempenho de suas funções. Não apenas deixou de substituí-lo na comissão como não o puniu”.
No dia seguinte à posse de Moraes, o Comando Militar do Leste anunciou que não realizará – em pleno ano do Bicentenário da Independência – a tradicional parada do 7 de Setembro na avenida Presidente Vargas, centro do Rio. Com a decisão, os militares não precisam mais se dividir entre dois eventos: serão vistos apenas nas manifestações golpistas da praia de Copacabana.
Fonte: Valor (acesse aqui)
Autor: Maria Cristina Fernandes
Publicado em: 18/08/2022