Para Conrado Hübner Mendes, a falta de compromisso ético e democrático das Forças Armadas não é episódica, mas inerente à instituição.
“Há instituições em que a corrupção funcional habita sua estrutura e ethos compartilhado”.
A origem está na história recente do país: o meio militar “nunca aceitou a transição para a democracia nem se democratizou. Entende hierarquia de cima para baixo e rejeita controle civil”. E o resultado é uma visão de mundo deturpada, dada também pela sua precária formação cultural e intelectual. Compreende-se portanto por que os militares embarcaram com tanta facilidade na aventura de um desqualificado como Jair Bolsonaro, expulso do Exército, para voltar ao poder.
Voltaram e não apenas colocaram em operação práticas corruptas e a autoconcessão de privilégios incabíveis numa democracia, mas, pior: passaram a adotar ou endossar discursos claramente autoritários, como os ataques ao sistema eleitoral e “opiniões jurídicas de sua lavra para confrontar decisões do mais alto tribunal do país. E a defender intervenção nesse tribunal. Juristas da era pré-constitucional oferecem apoio”.
Continua Hübner Mendes: “Militares inventaram lugares institucionais espúrios. Como se fossem intérpretes constitucionais últimos, tentam assumir função de ‘poder moderador’ e de âncora do processo eleitoral. Ilusionistas, viraram governo, mas se vendem como instituição de Estado”. Como se não bastasse, “ainda buscam ampliar competência da Justiça Militar (formada por ignorantes em direito) para julgar civis”.
Há quem diga que a maioria dos militares não compactua com essa mentalidade antidemocrática, e que existiria uma “hegemonia de legalistas na caserna”. Se for verdade, “os legalistas ainda não se apresentaram”.
Os porões da ditadura continuam incrustados na essência das Forças Armadas. Em suas palavras: “A autoestima militar tortura, mata e desova corpos na ponta da praia. Tem sido, na história, sua ‘legítima defesa da honra’.”
Diante disso, vale reforçar o que manda a democracia: “Forças Armadas, na Constituição, não são sócias nem gerentes do clube dos três poderes, mas funcionárias. Funcionárias com dever de recato: recato com dinheiro público, com suas armas, com seus modos e palavras”.
Fonte: Folha (acesse aqui)
Autor: Conrado Hübner Mendes
Publicado em: 27/07/2022