Os bastidores da articulação internacional para dar respaldo às eleições brasileiras e defender a democracia. Agora, é garantir a posse.
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Jamil Chade conta, no UOL, os bastidores da reação da comunidade internacional ao resultado das eleições no Brasil. A vitória de Lula foi recebida com alívio, depois de meses de articulações para impedir qualquer ruptura institucional por parte de Bolsonaro, em caso de derrota. Deu certo.
Para líderes como Joe Biden (Estados Unidos), Olaf Scholz (Alemanha) e Emmanuel Macron (França), “o que estava em jogo não era apenas a definição de quem comandaria a maior economia da América Latina, mas o futuro da sobrevivência da extrema direita, inclusive com a capacidade de influenciar na agenda mundial.
A lógica era simples: se o movimento ultraconservador é globalizado e se articula para produzir desinformação e se ajudar mutuamente em diversos lugares do mundo, a reação para a proteção da democracia também teria de ser articulada e internacional. E retirar o Brasil da aliança de extrema direita no mundo seria um importante golpe contra a tentativa desses grupos populistas de redefinir a agenda internacional, inclusive com alianças com Vladimir Putin e líderes que abertamente questionam a democracia liberal”.
Garantir a posse
Uma ameaça semelhante ao 6 de janeiro de 2021 – quando trumpistas invadiram o Capitólio para impedir o reconhecimento da vitória de Joe Biden – está no radar do governo eleito e da comunidade internacional. Lula pretende utilizar sua viagem à conferência do clima COP-27, no Egito, para pautar essa preocupação nas conversas com outros países, inclusive em reuniões com o próprio Biden e o secretário-geral da ONU, Antônio Guterres.
Se essa nova operação em defesa da democracia for bem articulada como a anterior, a posse de Lula está bem encaminhada.
Bastidores anti-golpe
- Em maio de 2022, uma visita do diretor da CIA, William Burns, ao Brasil deixou claro ao governo Bolsonaro que a Casa Branca não iria tolerar uma ruptura democrática nem questionamentos sobre as urnas.
- Em julho, a decisão de Bolsonaro de convocar embaixadores estrangeiros para lançar suspeitas sobre sistema eleitoral serviu para alertar o mundo: era grande o risco de o presidente não reconhecer uma eventual derrota.
- Iniciou-se uma articulação internacional. Com uma delegação formada por Jaques Wagner e Celso Amorim, Lula visitou embaixadas estrangeiras em Brasília. Entre os diversos temas, a necessidade de que as democracias reconhecessem o processo eleitoral.
- Na ONU, a então alta comissária de Direitos Humanos, Michelle Bachelet, soou o alerta sobre os ataques de Bolsonaro contra as urnas e contra o Judiciário.
- De sua parte, o TSE fez uma ofensiva para demonstrar credibilidade junto ao exterior, promovendo várias reuniões com embaixadas e viagens internacionais para diálogos com governos, sociedade civil e imprensa.
- Entre agosto e setembro, entrou em cena a sociedade civil: grupos como Washington Office, Instituto Vladimir Herzog e Conectas viajaram até os EUA e para capitais europeias na busca de apoio contra um eventual questionamento das eleições.
- No Senado americano, congressistas pressionaram o Departamento de Estado para que se comprometesse a reconhecer o resultado das eleições brasileiras.
- “Fundamental ainda foi a aprovação por unanimidade de uma resolução no Senado americano alertando que qualquer envolvimento dos militares brasileiros num golpe contra a democracia resultaria na suspensão imediata dos acordos militares entre Brasil e EUA. Generais brasileiros confessaram, nos bastidores, que aquela resolução teve um impacto nas Forças Armadas muito maior que os atos na Faculdade de Direito de São Paulo, em 11 de agosto, em defesa da democracia”.
- No Parlamento Europeu, em Bruxelas, dezenas de deputados assinaram recomendavam à Comissão Europeia suspender acordos e até usar de medidas comerciais contra o Brasil em caso de ruptura democrática.
- No dia do segundo turno, mais de 70 embaixadas participaram de um programa coordenado pelo TSE, visitando centros de votação e, no final da tarde, assistindo juntos à totalização de votos.
- Apenas 38 minutos após o TSE declarar Lula como vencedor, os Estados Unidos reconheceriam o “êxito” de uma eleição “justa e transparente”. Biden tentou ligar na mesma noite para Lula. Mas um problema de comunicação acabou adiando a conversa para o dia seguinte.
- Em 24 horas, o presidente eleito já tinha conversado com mais de 20 líderes internacionais. Em 48 horas, mais de cem países tinham se manifestado em telegramas ou nas redes sociais reconhecendo a vitória de Lula.
“Em Washington, na sede da ONU em Nova York, em Bruxelas, Paris ou Berlim, diplomatas não disfarçavam a comemoração: a aliança entre as democracias tinha funcionado. Agora, terá de trabalhar até a posse”
Fonte: UOL (acesse aqui)
Autor: Jamil Chade
Publicado em: 08/11/2022