Guilherme Casarões – O Estado de São Paulo – 18/07/22
Professor de Ciência Política e Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, Guilherme Casarões comenta a reunião na qual o presidente Jair Bolsonaro expôs a embaixadores e diplomatas sua estratégia golpista de desacreditar o sistema eleitoral por meio de uma profusão de mentiras.
“O ataque escancarado às instituições democráticas não trouxe nenhuma novidade, mas abriu duas novas frentes na rota de subversão das eleições deste ano. Primeiro, ao formalizar seu pacote de inverdades políticas a representantes estrangeiros, o presidente obriga governos a incluir em suas comunicações diplomáticas a versão de Bolsonaro, que até agora vinha sendo tratada como caricata (e irrelevante) bravata de campanha.
Segundo, ao internacionalizar a narrativa de vulnerabilidade eleitoral, Bolsonaro tenta criar obstáculos para que países reconheçam automaticamente o resultado das urnas, em caso de vitória do ex-presidente Lula. Ao semear dúvida sobre um processo que nunca foi questionado e que segue sem razões para ser colocado em xeque, quer-se, unicamente, protelar uma eventual transição de mandatário num contexto democrático.
Nessa celebração solene do golpe preventivo encabeçado pelo presidente, articulado por seus asseclas fardados e referendado pelo servil chanceler, os embaixadores estrangeiros, instados a comparecer por dever de ofício, serviram de meros amplificadores de uma teoria conspiratória que, até aqui, estava restrita aos círculos bolsonaristas nas redes sociais e no WhatsApp.
Pouco importa se os interlocutores dão crédito à versão do governo. O cerne desse lamentável roteiro envolve impor todo tipo de constrangimento – jurídico, político e agora diplomático – ao transcurso normal das eleições presidenciais.
Bolsonaro sabe que dificilmente alguma liderança estrangeira deixará de reconhecer o resultado das urnas no Brasil e a legitimidade de um novo presidente. Portanto, diante de uma possível derrota, a melhor estratégia é impedir que as eleições ocorram, nem que seja por meio de sucessivos crimes de responsabilidade. Até outubro, o presidente seguirá jogando pedras no caminho das eleições. Cada nova oportunidade de fazê-lo, como hoje, é uma vitória para Bolsonaro – e uma derrota para a democracia.”
Fonte: Estadão (acesse aqui)
Autor: Guilherme Casarões
Publicado em: 18/07/2022