Oliver Stuenkel – Instagram – 23/08/22
Em entrevista a Sara Sidner, da CNN, o professor de Relações Internacionais Oliver Stuenkel, da FGV-SP, avalia a movimentação militar em torno de Bolsonaro.
Há sérias preocupações de que, se ele perder, os militares o acompanhem. Existe a possibilidade de um golpe de Estado?
Tem havido vários sinais ambíguos por parte dos generais, que se beneficiaram tremendamente do tempo e das ofertas de Bolsonaro. Existe hoje um número sem precedentes de militares, inclusive vários generais, em posições de liderança no governo. Isso envolve muitas vantagens, inclusive financeiras. E alguns dizem que os militares não rejeitam totalmente as alegações de Bolsonaro quanto a supostas vulnerabilidades do sistema eleitoral, porque eles querem negociar com o governo eleito e dizer: “Nós aceitaremos a transição desde que possamos manter os numerosos benefícios que acumulamos sob Bolsonaro”. Mas certamente existem algumas correntes antidemocráticas nas Forças Armadas, que ainda celebram a ditadura militar. Não houve essa espécie de “ruptura limpa”, como tivemos em países como a Argentina, onde as Forças Armadas são muito explícitas ao dizer “Nós não queremos governar de novo” e que a ditadura foi um período terrível. Muita gente está preocupada com o que poderá acontecer se o resultado for muito apertado. E as Forças Armadas em vários casos realmente compartilharam as insinuações de Bolsonaro e pressionaram o Tribunal Eleitoral a permitir algum tipo de mecanismo de apuração paralelo. Acredito que temos potencial para um caos pré ou pós eleitoral. O que o Exército diz realmente será importante, e também o papel das Polícias Militares, sob os governadores. Mas certamente há sentimentos antidemocráticos.
O juiz da Suprema Corte e presidente do Tribunal Eleitoral [Alexandre de Moraes] afirmou que “Podemos viver um episódio ainda mais grave que o ataque de 6 de janeiro ao Capitólio”. Que influência você acha que Donald Trump tem sobre essas táticas de Bolsonaro?
Trump é uma inspiração para Bolsonaro, mas [o momento atual] também é produto da história do Brasil, da influência de longa data das Forças Armadas na política brasileira. Portanto, de certa forma, isso não é novidade. Mas vários aliados de Bolsonaro, inclusive um de seus filhos, disseram depois de 6 de janeiro que, com um melhor planejamento, os invasores apoiadores de Trump poderiam ter atingido seus objetivos. Bolsonaro foi um dos últimos presidentes a parabenizar Biden. Ele tem, até recentemente, sob o governo Biden, ecoado alegações de Trump sobre supostas fraudes nas urnas. Eu acho inclusive que, para o Brasil, um cenário como o de 6 de janeiro nem seria tão ruim, pois afinal a transição aconteceu. A maior vantagem que a democracia dos Estados Unidos tem sobre a brasileira é que nunca houve dúvida das credenciais pró-democracia das Forças Armadas americanas. A vantagem do Brasil é que o sistema eleitoral é muito mais sofisticado, e diferentemente dos Estados Unidos o Tribunal Eleitoral está pronto para anunciar o resultado final no mesmo dia da votação, portanto isso torna um pouco mais difícil o questionamento do resultado, eu diria. Mas certamente há um risco significativo de que o Brasil viva sua própria versão do 6 de janeiro.
**
E em artigo no Estadão no dia 23 de agosto, Oliver Stuenkel explica por que a “Eleição deixará sequelas na reputação das Forças Armadas brasileiras no exterior“.
Fonte: Instagram (acesse aqui)
Autor: Oliver Stuenkel
Publicado em: 23/08/2022